O esforço de qualquer governo para conter o avanço de uma doença é que menos pessoas sejam atingidas em um maior espaço de tempo para que o sistema de saúde não entre em colapso.
"Achatar" a curva é diminuir o número de casos envolvidos. Isso é importante porque uma coisa é precisar de 10 leitos de UTI diariamente por 30 dias, outra é precisar de 100 leitos em 3 dias. O achatamento da curva é uma maneira de fazer com que a epidemia não seja tão alta para que não afete tanta gente quanto poderia, permitindo que o sistema de saúde atenda todas as pessoas. O pico da curva epidêmica acontecerá em algum patamar, e isso depende do número de pessoas suscetíveis, das restrições sociais e do tempo que demora para implementar medidas.
Estatísticas apontam que, dos casos de coronavírus, 80% terão sintomas leves (resolvidos com uma consulta no posto de saúde e repouso em casa), 15% precisão de internação em
leitos clínicos e 5% exigirão internação em UTI. A média de internação em UTI é de 14 a 21 dias. Não lotar emergências é importante para todos porque um paciente com a doença
concorrerá por atendimento com quem tem qualquer outro problema.
O Brasil tem, a seu favor, o Sistema Único de Saúde (SUS), que prevê atendimento de graça à população. No entanto, falta dinheiro: o SUS perdeu R$ 20 bilhões em seu orçamento
a partir de 2016 após a criação do teto de gastos, aponta estudo do Conselho Nacional de Saúde (CNS). O segundo obstáculo é a falta de leitos de UTI para internação: há cerca
de 16 mil leitos para adultos no SUS no Brasil, com ocupação de 95% só com as demandas normais, sem coronavírus, segundo a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib).
Em cenário de pandemia, a entidade estima aumento de 20% da demanda.
A Itália demorou a desincentivar aglomerações e viu um crescimento absurdamente alto no número de infectados, passando de apenas três em 21 de fevereiro para mais de 21,1 mil
em 15 de março. Não há sistema de saúde que suporte tanta gente buscando assistência médica, e o resultado é a distopia que alguns hospitais italianos enfrentam: decidir,
diariamente, quem deve viver ou morrer.
Países como Cingapura e Hong Kong tiveram grande sucesso em "achatar" a curva de avanço da epidemia porque os governos e a própria população aderiram a essas precauções,
ficando em casa o máximo possível. Mas a discordância surge na decisão de até que ponto elas devem chegar (seria cedo demais para cancelar aulas?).
Para Silvio Ferreira, professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e especialista em criar modelos de previsão estatísticos, o Brasil está muito
mais próximo da situação crítica da Itália e da Espanha, do que de nações asiáticas que tiveram sucesso no controle do coronavírus. Ele destaca que intervenções
do governo levam de duas a três semanas para terem resultado.
Para conter a velocidade do coronavírus, não basta apenas incentivar as restrições de contato e lembrar da higiene pessoal, mas também realizar diagnósticos na população.
O problema no Brasil é o limite de preço e de exames disponíveis – não há 200 milhões de kits para todos.
"O achatamento da curva não tem a ver só com os casos administrados, mas também com os assintomáticos que seguem a vida normalmente. Achatar a curva é muito mais do que pegar
pessoas doentes e colocar em isolamento, mas ter uma mudança cultural. Na Itália, só é feito teste em quem tem sintoma, enquanto que a Coreia faz teste para qualquer um. Viu-se,
então, que a distribuição por faixa etária é diferente. Na Coreia, quem mais tem coronavírus são jovens entre 20 e 40 anos com sintomas muito brandos, mas que seguem como
transmissores" acrescenta o professor da UFV.
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